segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

CAPÍTULO LVII – RETRATOS DE ESTRELAS SHAKESPEARIANAS

Da fonte de sua imaginação o autor de peças escolhe aqueles elementos do espectro da personalidade e experiência humanas que sejam apropriados a seu conceito de um tema determinado, e ele organiza aqueles elementos de forma dramática a ser interpretada pelos atores, atrizes e todos os outros participantes do teatro. Todas as formas de arte são representações destiladas da consciência humana; obras de arte, como espelhos, refletem para a humanidade representações intensificadas dela e de suas experiências. O escritor lida com a expressão objetiva da emoção, experiência e consciência humana; os dramas são apresentados e interpretados em termos de padrões de aparência, personalidade, atividade e relacionamento objetivamente reconhecíveis. Atores e atrizes em performance são microcosmos simbólicos do eu da própria humanidade – cada papel desempenhado por um ator é simbólico de um fragmento da consciência humana de identidade e existência nesse plano.
Portanto, nas criações de um verdadeiro gênio como William Shakespeare foi (ou quem quer que tenha escrito sob aquele nome!), uma qualidade variável de estratégia e compreensão artística tornou possível a caracterização que reflete o arquétipo humano, localizado por nome, sexo, período e nacionalidade, mas que realmente simboliza padrões universais da natureza e experiência humana. Cedo ou tarde, todos nos confrontamos com Hamlet, a Cordélia, o Otelo, a Lady Macbeth, o Romeu e a Julieta em nós mesmos. Nós transbordamos ou rimos em resposta a estas – e outras – caracterizações devido a algo em nosso conhecimento subconsciente profundo que é estimulado ao vermos atores interpretarem as imaginações criativas de um grande dramaturgo. Nossas próprias experiências – presentes ou passadas – são revisitadas de algum modo. Memórias de sentimentos de alegria e sofrimento antigas, esquecidas há muito vêm à tona. Nossa percepção (consciência de si individualizada em muitas encarnações) é despertada, e o que vemos no palco somos nós próprios condensados e focalizados pelas necessidades dramáticas do tema interpretado. Somos homens e mulheres, todas as profissões, todas as nacionalidades, todos os relacionamentos, todas as motivações e falhas, todas as alegrias e todos os sofrimentos. O escritor, através dos princípios estéticos inerentes à arte dramática criativa, e os atores, através dos princípios estéticos da arte dramática interpretativa, recarregam nossa consciência de seres plenos, de nossa identidade plena como indivíduos, e nosso relacionamento pleno com os demais indivíduos.
Estudantes de astrologia: preparem uma cópia do Grande Mandala Astrológico, um círculo de doze casas com Áries no Ascendente e os demais signos em sequência – trinta graus para cada casa; Sol, Lua e os outros planetas nos signos e casas de suas dignidades. Medite sobre esse mandala por um instante como o retrato simbólico composto da humanidade. É a partir desse desenho e arranjo simbólico que derivam todos os horóscopos humanos e ele representa o total daquilo que é interpretado, criativamente ou de outro modo, em todas as belas artes. É a figura da consciência, identidade e experiência humana. Agora, para aprofundar na arte dramática, “personalize” o Sol, Lua e os planetas como personagens no Drama da Vida Humana; deixe sua mente correr sobre o escopo dessas “personalidades” imaginando cada planeta (focalizador vibratório) em cada um dos signos zodiacais, cada uma das casas ambientais, cada qual aspectado (por conjunção, sextil, trígono, quadratura e oposição) aos demais. Acrescente os fatores de ambos os sexos, todas as idades, todas as nacionalidades, todos os períodos históricos e você vislumbrará o tremendo espectro daquilo que constitui o grão para o moinho do dramaturgo. Você e Eu somos nesse quadro – como somos, como fomos e como seremos enquanto nossa identidade for “ser humano”. Você está agora atuando no papel que sua consciência de vida criou. Humanos, em sua vida na Terra, são dramaturgos e atores – cada um usa sua consciência para interpretar a vida.
A Arte do Teatro, mais diretamente que qualquer outra forma de arte, torna possível o estimulo do coração humano às lágrimas e risos. O choro e o riso são as duas formas pelas quais a vida torna possível descristalizar as tensões e congestões do plexo solar. Em resposta às agonias contidas, sofrimentos, saudades e desesperos na tragédia dramática somos movidos a chorar em memória de nossas agonias e sofrimentos. Em resposta à bufonaria, sátira e caricatura, nossos intelectos são “estimulados” de tal forma a sermos amolecidos em riso pelas experiências que refletem nossos absurdos, embaraços e obstinações. Na vivência do drama romântico (do tipo final feliz) nos extasiamos com emoções intensas, amor profundo, aspirações, esforços e a realização de ideais. O propósito oculto do drama trágico é induzir sentimentos de simpatia pelos demais humanos – não a intensificação da autopiedade. O da comédia e da sátira é descristalizar as congestões relacionadas à autocorreção pomposa, hipocrisia e seriedade excessiva – para nos fazer “cair do cavalo”. O drama romântico tem como proposito interno intensificar nossa consciência do “tom, cor e projeto” de nossa vida – para irradiar percepção de maior capacidade de amor, devoção, esforço e aspiração. O “final feliz” das peças românticas é o simbolismo dramatizado da aspiração de todos os humanos realizarem ideais e evoluir através da regeneração e transmutação. O “final feliz” nos lembra da divindade da vida.
A poesia e nobreza da dramaturgia Shakespeariana eleva um espelho imenso no qual a humanidade pode se enxergar. Apreciemos algumas caracterizações Shakespearianas enquanto representações de “pontos focais” da natureza humana e padrões de experiência humana relacionando-os com simbolismo astrológico simples e básico:
Romeu e Julieta: do ponto de vista reencarnacionista, este drama seria muito mais verdadeiramente trágico em tom e efeito, se os dois “amantes desafortunados” permitissem que suas aderências cristalizadas aos preconceitos das famílias impedissem ou desintegrassem sua união amorosa. O “Romeu e Julieta” em cada humano é o que anseia pela polarização total chamada de Casamento Hermético; mas essa “união interior do eu com o Eu” só pode ocorrer pelo cumprimento dos padrões de relacionamentos através do amor: As “casas dos Montéquios e dos Capuletos” constituem as “imagens petrificadas” do preconceito familiar e da posição social representados astrologicamente pelo diâmetro Câncer- Capricórnio e aspectos congestionantes entre a Lua e Saturno. Todos derivamos nossa encarnação de um padrão familiar ao qual somos atraídos pelas leis do carma e da simpatia vibratória. Entretanto, cada um deve, em seu tempo, descristalizar as congestões desse padrão, de oitava a oitava pela mais pura e individualizada expressão de amor. Romeu transpassa paredes para estar com Julieta; esse transpassar é Urano descristalizando ou transcendendo os limites impostos por Saturno, símbolo da “congestão das formas”. Personalizando um pouco – Romeu e Julieta foram situados temporalmente, evolutivamente falando, para provar seu amor mútuo; seus desafios foram através da inimizade, rivalidade e preconceito de seus grupos familiares. Embora eles morreram, sua tragédia foi amenizada pela sua devoção mútua – ao invés de medo quanto ao resguardo da “imagem da família”. Todos uma hora ou outra temos a oportunidade de uma encarnação na qual podemos provar a sinceridade de nossas aspirações e ideais cardíacos mais elevados. Para fazer isso, temos que usar os poderes representados abstratamente pelo diâmetro Leão-Aquário para transcender as fixações de Câncer-Capricórnio. Permanecer fixos em Câncer-Capricórnio é retroceder nos poderes evolucionários que trabalham para a liberação e progresso. A poesia luminosa da cena da varanda representa a pureza radiante do ressurgimento do verdadeiro amor; Romeu e Julieta amavam-se desde uma encarnação passada assim como amamos nosso eu ideal através de todas as nossas encarnações. A beleza inspirativa da peça – enquanto poesia – tipifica a radiação interna que acompanha o reconhecimento de nossos ideais.
Rei Lear: este drama é a tragédia do julgamento corrompido por ganância por aprovação – tragédia dupla pois quando a verdade é descoberta, os negativos interiores estão muito profundamente arraigados para serem contrabalançados por esforços construtivos ou regenerativos. A constatação da hipocrisia e desonra das duas filhas mais velhas, que ele havia supervalorizado, e a sinceridade e fidelidade de Cordélia, que ele subestimou e rejeitou, levou Lear a reagir com tal excesso de auto repulsa que acabou enlouquecendo. Astrologicamente, parece que Lear é o retrato de “Júpiter aflito”. Ele baseou sua estima favorável às suas filhas mais velhas sob os protestos de devoção e afeição – indicativos de que uma insinceridade em sua própria natureza serviu de contraparte à falsidade delas. A ambição delas por terras, dinheiro e maridos de alta posição serviu de contraparte para sua ganância por aprovação. Nós podemos – e o fazemos – lamentar o testemunho da tragédia do demente irracional que corta o coração em seu excesso de auto repulsa, pois nós também somos movidos pelo desejo e ganância de clamar pelo falso e rejeitar a verdade. A constatação de tal equívoco causa um dos mais terríveis tipos de desilusão, o tipo que pode desintegrar nosso autocontrole se formos incapazes de aprender a partir da experiência da desilusão. Lear adorava sua falsa imagem, sincronizada em grau com a falsidade de suas duas filhas. Como podemos ser Lear, cabe a nós exercitar as contrapartidas para os padrões negativos de Júpiter por discriminação, sinceridade e afastamento dos símbolos de crenças e compensações subconscientes. Cordélia personifica a sinceridade da autoanálise – o saber do que é verdadeiro e real. Quando desprezamos Cordélia, nos escravizamos a imagens falsas e decepcionantes; quando amamos e valorizamos Cordélia, recusamos o falso e nos vinculamos ao puro e verdadeiro.
Otelo: Este estudo dramático da destrutividade do ciúme pede uma pequena consideração psicológica. Nunca – em qualquer sentido da palavra – somos ciumentos de outra pessoa. O ciúme é auto imposto e baseado na inferioridade real ou imaginada que, por sua vez se baseia na não realização de um potencial, ou alguma faceta obscura de auto avaliação. Ao personalizarmos Otelo por um instante, podemos abstrair que o mesmo pode ter sentido inferioridade decorrente de sua cor de pele negra, particularmente em relação à sua esposa branca, Desdêmona, que verdadeiramente o amava. Iago simboliza a esperteza e duplicidade comuns decorrentes de auto justificação – o desequilíbrio no exercício de auto honestidade. O assassinato de Desdêmona por Otelo simboliza o “assassinato da consciência” que cometemos motivados por racionalizações e justificativas negativas, nesse caso assassinamos a verdadeira autoavaliação. Pelo exercício dessas racionalizações negativas atribuímos verdade a mentiras e nossos passos se mostram confusos até cairmos. As qualidades de nobreza que Desdêmona amava em Otelo representam as virtudes nos seres humanos que inspiram amor e honra; mas Otelo, cego pelo seu negativo interior, não pôde perceber e valorizar sua verdade. Iago simboliza a inimizade de Otelo consigo mesmo enfatizada pela mentira – representando Desdêmona como sendo infiel. Otelo sob pressão de seu negativo psicológico preferiu acreditar na mentira. Pressionado além de suas capacidades pela pressão interior ele assassina quem ele mais amava – a verdade de seu casamento com Desdêmona. Marte, enquanto co-regente de Escorpião, é a ação destrutiva e mortal pela qual expressamos nossos negativos escorpiônicos profundamente reprimidos – os níveis e áreas de desejos e poderes emocionais não transmutados. A salvação de Marte é transmutação pela expressão em ações construtivas e inteligentes. Otelo se traiu duas vezes: ao dar ouvidos às sugestões de Iago, e colocando em ação aquilo que representa seu desejo de “matar” aquilo que Iago o influenciou a acreditar. Um homem nobre, merecedor de amor e honra, joga tudo fora ao focar em seu eu irreal ao invés de fazê-lo em sua Realidade. Nós “matamos” quando colocamos em ação crença em uma mentira a nosso respeito. Um tema realmente trágico.
Cleópatra: A morte de Cleópatra por suicídio não neutraliza o poder da peça Antônio e Cleópatra como exemplo de drama altamente romântico. Cleópatra, enquanto personagem feminino, simboliza a combinação dos elementos Sol e Vênus na natureza humana. De acordo com a representação histórica e Shakespeariana, ela foi maravilhosamente abençoada com atributos de beleza física, charme, inteligência, cultura e estratégia – uma mulher tão consciente dos poderes interiores que viveu sempre em termos de amplidão. Ela possuía enorme riqueza – e a utilizou de forma irrestrita. Ela tinha grande capacidade para amor – e se entregou ao amor realmente e completamente. Quaisquer fossem suas limitações não havia nada em sua natureza que fosse cruel, irrelevante, sórdido ou vulgar. Uma grande atriz – como Katherine Cornell – pôde projetar essas qualidades de caráter e personalidade de forma que a audiência experimentou uma recarga de desejo e aspiração de “viver grandemente” em termos de riqueza, poder, beleza, cultura, inteligência, estratégia ao invés de continuar uma vida de ignomínia e degradação pela captura. Cleópatra escolhe acabar com sua vida pelas próprias mãos; simbolizando AQUILO que na natureza humana que quer aprender a viver em termos de dignidade e auto respeito. Alguns de nós se arrastam de tempos em tempos, por medo ou sentimentos de inferioridade; mas não nos gostamos por isso e cedo ou tarde nos rebelamos contra o negativo interior. A “Cleópatra em nós” simboliza nosso desdém pelo irrelevante e malicioso; “ela” nos faz ansiar pela experiência vívida buscada com coragem e confiança em nossas habilidades. Todos temos talentos, ambições, aspirações e desejos; a vibração do Sol – enquanto regente do signo real de Leão – é o que usamos como poder de autodeterminação na depuração de “pequenezas de pensamentos e sentimentos”.

Beatriz e Benedito: Muito Barulho por Nada é uma das mais agradáveis e deliciosas das comédias. Ela apresenta de forma viva e brilhante a “antiga história da batalha dos sexos” – fonte de muito o que é apresentado em todos os tempos no drama cômico. As posturas, truques e aparelhos que homens e mulheres apresentam em relação entre si são representados pelo movimento anti-horário do diâmetro horizontal Áries-Libra do Grande Mandala. Estes dois signos representam a polarização da individualidade expressiva da humanidade – enquanto “macho” e “fêmea”. Cada um dos dois signos desse diâmetro simboliza facetas da personalidade peculiares à masculinidade e à feminilidade, mas juntos formam um diâmetro; eles parecem ser “diferentes”, mas cada um complementa o outro. O drama cômico referente a esse assunto torna possível reconhecermos de forma saudável nossa polaridade subjetiva a partir do riso. Humanos são inatamente bipolares – tivemos todos experiência do sexo oposto ao que nos manifestamos presentemente. Ao reconhecermos que “sexo oposto” é simplesmente nosso “eu subjetivo” podemos apreciar e aproveitar nossos “eus ocultos” conforme somos retratados no palco cômico. Na risada relaxamos os sentimentos subconscientes de tensão e quando rimos, gargalhamos e gritamos aos truques dos atores e atrizes comediantes que estão interpretando o – eventualmente – ridículo jogo do homem e da mulher em relação entre si, atualizamos nosso ponto de vista em relação à polaridade humana. Beatriz e Benedito são os protagonistas da humanidade destinada a se apaixonar e adquirir experiência juntos – independente de preconceitos bobos, falsa autoestima e “imagens de hesitação”. A vida trabalha continuamente para nos colocar frente a frente para nosso desenvolvimento mútuo e cumprimento dos potenciais simbolizados por Áries-Libra. Benedito é Marte que vê o charme e amabilidade de Vênus em Beatriz; Beatriz é Vênus que precisa do “beijo de Marte” a fim de despertar para a realização clara de seu valor enquanto mulher. Há um pouco de Benedito e Beatriz em cada um de nós – podemos lutar e argumentar por um tempo, mas cedo ou tarde Benedito-Marte e Beatriz-Vênus trazem o jogo – de nossa experiência de relacionamento – a um final feliz pela sua união.

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